Wednesday, January 14, 2009

Horizonte...

O sonho é ver as formas invisíveis
Da distância imprecisa, e, com sensíveis
Movimentos da esp'rança e da vontade,
Buscar na linha fria do horizonte
A árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte...
Os beijos merecidos da Verdade.

Fernando Pessoa

Saturday, January 10, 2009

Yellow...

Pegou-me na mão e fez-me girar como uma bailarina

Os braços dele envolvem o corpo dela no meio de flores e folhas azuis de um cenário idílico. O azulejo do balcão do café pinta-se enquanto o chocolate quente lhe dança na boca.
A porta abre-se para a muralha, e fecha-se para a luz quente espelhada no chão e nas mesas de madeira, entre o cheiro de um café e de um whisky. E nos olhos da Clara e do Miguel estão as luzes e os reflexos da árvore de natal enorme e salpicada de enfeites, que protege as figuras do presépio.

- Miguel, já viste as prateleiras atrás do balcão? Estão cheias de garrafas que deixam cruzar os líquidos dourados...

- Oh Clara, continuas a mesma menina observadora, perdida entre o que vês e o que imaginas. Olha para mim, estás linda hoje...

Encostou-se para trás enquanto lhe sorvia o toque, deixou que ele a contemplasse linda, corou e quis voltar a reparar.

- Adoro quando me trazes aqui, e hoje gostei de ficar no andar de baixo, nunca tinha respirado esta parte do bar. Em cima é mais casinha de bonecas, com aqueles sofás de castelos de princesas e as cortinas nos cantinhos da janela. Não achas? Oh vá lá, sabes que sou incapaz de parar de olhar, sabes que gosto...Tens que me deixar inebriar-me e concentrar-me no espaço nos primeiros minutos, tens de me deixar sentir que faço parte dele...

- Sim...já sei minha Clarinha...A tua sorte é que nesses instantes posso sentir o teu brilho de olhos...Já podes voltar para mim?

- Só se te puder partilhar com este chocolate...

Interrompeu o jazz ao arrastar o banco, mas ficou mais perto dela e das nuvens. Já não se viam há muito tempo. Mas a Clara estava na mesma, linda, inteligente, perspicaz, sonhadora, encantada e encantadora.

- Não olhes assim para mim Miguel...Olha, tenho tanta coisa para te contar. Nem imaginas o que me aconteceu no outro dia...Posso contar?

- Pedes-me se podes contar com essa carinha de menina de quatro anos ansiosa com as novidades, é impossível dizer-te que não...Conta...

- Oh...Também não é bem assim...Pronto, vou contar...não resisto. Foi num domingo no Porto. Fui passear com a minha irmã para St.Catarina, estava cheia de músicos, de palhaços a moldar balões, de vendedores de castanhas, e havia um homem estátua...

O Homem vestia-se todo de branco e tinha uma máscara. Em cima de uma caixa, à altura de sonhos de crianças, observava imóvel o movimento envolvente da rua, enquanto esperava que caíssem moedas. Não resisti, já o tinha visto num outro dia, procurei a menina no olho por detrás da máscara e deixei cair a minha moeda. E a rua cheia ficou vazia. Ficou o homem estátua e a menina escondida nos olhos dele. Pegou-me na mão e fez-me girar como uma bailarina, sorriu atrás da máscara, fez-me uma festa e voltou a imobilizar-se enquanto eu recuperava o fôlego. E a rua encheu-se de novo de olhos pregados naquele momento.

- Foi mesmo bonito Miguel...Senti-me tão pequenina e soube-me tão bem...Queres provar o meu chocolate?