Sentada nos cartões que alguém reservou para os gatos, com as pernas tapadas até aos tornozelos, ela molhava-se...enquanto chovia. Pés de unhas negras, enormes; pés calejados, descalços, molhados. Chamou mais a minha atenção por ser aquela mulher e ter aquele olhar meigo e de loucura; por não pertencer ali mas ter o direito de pertencer ao mundo.
- Obrigada menina. Só estou aqui a fazer horas, à espera que abra o albergue, que agora não me deixam ir para lá.
- Ah....está bem...
- É é...às seis já abrem. São as cinco, agora, não é menina?
- Sim, são as 5h...
- Obrigada.
(avancei)
E gritou-me...
- Obrigada minha menina, obrigada.
Tem cabelo branco, muito sujo e apertado. Tem um lenço preto tingido de manchas e tem aquela praça que se faz deserta, em frente à faculdade. No dia seguinte, quando lhe demos o pão e o leite, chorou. Mas já não chovia.
- Onde dorme? Tem sítio para ficar?
- Durmo numa casa ali em baixo. Já me abrem a porta. Não digam a ninguém meninas.
Não quer camisolas vermelhas, azuis ou amarelas. Quer a cor mais próxima do luto que carrega.
- Esta camisola vou levá-la amanhã à igreja, porque cheira bem.
E agarrou-se a ela com carinho. Foi como se o Sol abrisse por entre as nuvens agitado pela luz daquele sorriso, foi como se o mundo fosse de cores suaves e sensações quentes. Foi como se fosse perfeito...
Gosto dela, velhinha deambulante.
Mas não gosto de imaginá-la sozinha na praça, no lugar dos gatos...Pelo menos não chove e guardadas nos olhos fechados tem as estrelas...
7 comments:
Também a vi. Também a mim agradeceu o facto de poder ali estar... e eu apenas sorri.
Eu já vi a velhinha do olhar doce*
Penso que todas nós já a vimos e muitas de nós já lhe demos um pouco de nós. Ou um chá, uns chinelos, ou uns minutos de atenção que se abrem em confusões de anos, vidas desnorteadas e grandes injustiças. Acho mesmo que o que podemos oferecer de melhor são os minutos de conversa, de compaixão por um final de vida de tristeza, de amizade sem qualquer interesse.
Essa velhinha faz-me pensar que o que mais temo na vida é acabar sem sonhos...
Pois, já todos a vimos, sim. Já todos percebemos que ficou a fazer um bocadinho parte de nós.
Não pude deixar de recordar uma canção da Mafalda Veiga, em que ela recorda um velho e alerta para o drama da velhice.
Também foi bom aparecer por aqui e recordar a tua sensibilidade, a tua escrita doce.
E o grande Álvaro, meu heterónimo preferido andava também por aqui...
Foi bom aparecer.
Um beijinho.
Luísa Lopes
Vou aproveitar par te dar uma novidade: o Mário Sá é o novo cronista do OP, que tem novo endereço em www.outrapresenca.com
A Vida deve viver-se em cada momento e não em cada dia! Em cada instante que passa podemos olhar e ver ao nosso lado uma história, seja ela boa ou má, que nos deixa perplexos, pois no olhar se vê a tristeza e a alegria d quem passa indiferente num mundo maravilhosa e cretinamente feliz! Quem tem para dar, que dê, mas k não o faça por caridade, k o faça por sentir um brilho no fundo dos olhos cor de mel, k ficam doces ao ajudar, soltando lágrimas que brotam do coraçao.Sê feliz, vive os sonhos e nunca te esqueças... a cada passo k dês não olhes apenas mas vê, e além disso SORRI pois o teu sorriso alegra o mais pequeno ser ke vive neste mundo! Abraço daquele que te chama safira D.A.
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